Devaneios noturnos (ou o esvaziamento temporário de uma produção científica)

Belchior desapareceu.
Os jornais dizem que nenhum familiar tem notícias dele há dois anos.
Bem, eu não ouço falarem nada do Belchior há muito mais tempo que isso. Mas isso não vem ao caso. Ao menos não a esse caso. O caso é que ao ler esta manchete lembrei-me de uma canção do Belchior... Acho que chama “Coração selvagem”, se eu estiver errada alguém me deixe um comentário. Bem, eu acho essa música muito forte, nela ele diz, entre outras coisas, que tem “pressa de viver”..
(Parêntese)
Eu tenho uma amiga que de vez em quando lembra de si mesma... Ela simplesmente chega perto de nós e diz: - Olha eu li isso aqui e lembrei de mim.
Bem, eu sempre achei isso muito esquisito, mas foi exatamente o que eu senti ao ouvir essa canção... Eu lembrei de mim.. E digo mais: Descobri que lembro de mim mesma muito mais do que eu imaginava...
(Pedaço da canção)
Meu bem,
O meu lugar é onde você quer que ele seja
Não quero o que a cabeça pensa
Quero o que a alma deseja
Arco-íris, anjo rebelde
Eu quero corpo,
Tenho pressa de viver

Lembrei de mim porque a música retrata a angústia de alguém que perdeu algo precioso: tempo. E eu sempre me angustiei por causa do passar do tempo.
Fico sempre pensando o que faria voltando 10, 15 anos no tempo. Faria algo diferente? O que será que não vivi? Faz-me falta hoje? Poderia algo ter sido diferente?
Não me entenda mal, tenho grande apreço pelo que tenho vivido, nem é falta de perspectivas futuras...
Me lembro de quando tinha 10 anos a menos... Achando que chegar aos trinta era resolver muitos dos problemas que tinha aos vinte. Bem, eu ainda não tenho trinta, estou bem perto. E de fato muitos problemas são deixados para trás com o passar do tempo... Mas o problema é que não dá muito para precisar se as questões foram resolvidas ou se aconteceu como acontece com a maioria das outras coisas: eu simplesmente parei de me importar.
Porque é isso que me acontece e é isso que me angustia: Consegui lidar melhor com aquilo que antes era tão pesado pra mim ou simplesmente parei de me importar?
(Pedaço da canção)
Meu bem,
O mundo inteiro está naquela estrada ali em frente
Beba um refrigerante, coma um cachorro-quente
Sim, já é outra viagem
E o meu coração selvagem
Tem essa pressa de viver

Eu já tive pressa de viver... E hoje o que mais tenho à minha frente é estrada (literal e metaforicamente); porém olho para estrada e sinto apenas nostalgia...
(Pedaço da canção)
Meu bem,
Mas quando a vida nos violentar
Pediremos ao bom Deus que nos ajude
Falaremos para vida:
- Vida pisa devagar, meu coração cuidado é frágil...
(…)
Meu bem
Talvez você possa compreender a minha solidão
O meu som, a minha fúria
E essa pressa de viver
Esse jeito de deixar sempre de lado a certeza
E a buscar tudo de novo com paixão
Andar o caminho errado
Pela simples alegria de ser...

Não sei quando o Belchior fez essa música... Poderia descobrir mas não quero... Prefiro pensar que ele escreveu essa canção antes dos trinta. Duvido muito que alguém com mais de trinta anos consiga expressar tamanha angústia frente o tempo e tamanho desejo de sustentar tal rebeldia ainda que latente...
Duvido!
Se alguém descobrir que a música foi escrita pelo compositor após os trinta, me deixe um comentário.
Mas duvido!


Comentários

Postagens mais visitadas