Psicanálise: outros espaços (onde se faz barulho sem falar)















Favor clicar para ampliar a imagem. Se você não fizer isso meu texto inteiro não fará sentido algum...
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É. Eu também li. O Lacan tem dois textos falando da possibilidade da psicanálise presentificar-se em outros espaços que não os consultórios conhecidos de antigamente... Esses textos são da década de sessenta, mas Freud já falava desta possibilidade e até desta responsabilidade dos analistas de levar a psicanálise a outros espaços. Mas ultimamente parece que os analistas tem levado esta questão mais a sério. Principalmente porque cada vez mais aumenta o número de analistas nas instituições públicas de saúde: espaços em que efetivamente é preciso repensar todo escopo de intervenção possível à psicanálise, para que ela permaneça psicanálise. A saúde pública escancara as impossibilidades, e qualquer intervenção terapêutica precisa 'rebolar' para atingir qualquer que seja sua meta.
Bem, atualmente quem pesquisa ou faz qualquer outra coisa que envolva a psicanálise certamente já (pelo menos) ouviu falar na tal 'psicanálise aplicada'. É dela que Lacan fala nestes textos que citei, e em momento algum ele contrapõe psicanálise aplicada e psicanálise pura (aquele destinada a formar analistas), muito ao contrário, não há psicanálise aplicada sem psicanálise pura. Todavia, o que Lacan pontuou como psicanálise aplicada é aquela aplicada à terapêutica, e ele diz que esta é a responsável por presentificar a psicanálise no mundo. A partir daí os analistas dissecaram este texto do Lacan para justificar a incidência da psicanálise em outros campos que não o consultório. Éric Laurent convocou o time da psicanálise a sair dos consultórios e tomar a cidade, as ruas, os espaços. Largar o elitismo e vestir a camisa 'analista-cidadão'.
E estes espaços não cessam... É psicanálise na favela, psicanálise no teatro, psicanálise na saúde mental, psicanálise na escola, psicanálise nas empresas, psicanálise no... Twitter???
Pois é. Quem ampliou a figura acima já deve ter concluído que Jacques-Alain Miller (genro e detentor dos direitos autorais da obra de Jacques Lacan) está no Twitter.
Bom, além de criticar, quero tecer uma piadinha infame e típica da também famosa "psicanálise selvagem"... Ora, se a única coisa que não devemos perder de vista ao trabalhar com psicanálise é a noção de não-todo, ou seja, que a psicanálise gira em torno de um furo, que a verdade nunca pode ser toda dita, por que raios a maior referência da psicanálise atualmente supõe poder fechar questões com menos de 200 caracteres?
Ok. Posso estar sendo muito extremista. Mas de fato eu, como profissional atravessada pela psicanálise, e não me autorizo a mim mesma como psicanalista por levar a psicanálise muito a sério, enfim.. Temo que a abertura destes novos espaços conduzam ao fechamento do inconsciente. E aí teremos o que Viganò alertou com relação à reforma psiquiátrica: "mais espaços onde se faz barulho sem falar".
Para que isso não aconteça, é necessário levar a sério o que Freud nos alertou em "Linhas de progresso da terapia analítica" e também o contemporâneo Romildo do Rêgo Barros em "Sem standard, mas não sem princípios".

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Referências:
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Os textos de Lacan a que me referi são: Ato de fundação e Proposição de 9 de outubro, ambos do livro Outros Escritos.

O texto Linhas de progresso da terapia analítica de Freud encontra-se no Volume 14 da obra completa lançada pela Imago Editora.

O texto de Romildo do Rêgo Barros pode ser encontrado aqui:
http://www.ebp.org.br/biblioteca/pdf_biblioteca/Romildo_do_Rego_Barros_Sem_standard_mas_nao_sem_principio.pdf

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